quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Brasil Afora: sem samba, Salgueiro é impulsionado por forró e funerária

Fruto de um arranjo inusitado como patrocínio, o Carcará se profissionalizou em 2005 e chegou a disputar a Série B do Brasileiro no ano passado

No calor de uma campanha eleitoral pela Prefeitura de Salgueiro, município localizado a 518km do Recife, no Sertão pernambucano, um compromisso nada comum foi assumido no palanque. Os empresários Aílton Souza (então candidato a vice-prefeito) e seu amigo Clebel Cordeiro prometeram, em caso de vitória, profissionalizar o clube amador mais antigo da cidade, que tem nome de escola de samba, mas vê o ritmo mais brasileiro passar distante da aridez da região.
Passado o pleito, Aílton Souza não conseguiu se eleger, mas quis pôr em prática o desejo de fazer com que o Salgueiro, fundado em 1972, disputasse competições oficiais e a cidade entrasse nos noticiários por um motivo mais ilustre. Antes, a terra era conhecida apenas por integrar o polígono da maconha (região que abraça o Sertão da Bahia e de Pernambuco).
Foi aí que a parceria singular que sustenta o clube sertanejo entrou em ação. Para conseguir formar, em 2005, a equipe que disputaria a Série A2 do Campeonato Pernambucano, o Carcará (ave de rapina comum na região) precisou que seus idealizadores investissem, tirando dinheiro do próprio bolso.


Salgueiro - camisa banda de forró, casa funerária (Foto: Divulgação) 
Banda de forró e casa funerária patrocinaram o Salgueiro (Foto: Divulgação)
E se não havia samba na cidade, tinha forró. E caixões. Aílton Souza, dono da banda Limão com Mel, e Clebel Cordeiro, proprietário de uma funerária, se uniram e decidiram fazer com que suas empresas vestissem a camisa vermelha, branca e verde.
Ambos, inclusive, já haviam participado das atividades do time na época do amadorismo. Aílton Souza desempenhou a função de gandula, enquanto Clebel Crodeiro foi goleiro. Já no primeiro ano de profissionalismo, ainda em 2005, conseguiram o acesso do time à Primeira Divisão do Pernambucano.
- Queríamos devolver à cidade tudo o que ela nos deu. O Salgueiro precisava de investimento e de uma equipe de futebol para movimentar a cidade - explicou Clebel Cordeiro, atual presidente do clube.

Estourando nas paradas
O Tricolor Sertanejo, ainda aprendendo a “dançar” com as próprias pernas, não se segurou no ano de estreia na divisão principal do Campeonato Pernambucano e foi rebaixado. Em 2007, veio a volta por cima: campeão da Série A2. A partir daí, o Salgueiro não parou mais.

Sede do Salgueiro-PE (Foto: Tiago Medeiros / GloboEsporte.com) 
Como clube amador, o Salgueiro existe desde 1972 (Foto: Tiago Medeiros / GloboEsporte.com)
Na temporada seguinte, com um quarto lugar no Estadual, o time conquistou uma vaga na Terceira Divisão do Brasileiro. Três anos depois, a equipe já pintava entre as 40 melhores do país, na tão disputada Série B. Na comemoração pelo acesso, muita festa e carreata pela cidade, com show de forró, é claro, da Limão com Mel.
- Esperávamos, sim, chegar algum dia na Segunda Divisão, mas não da forma como aconteceu. Foi tudo muito rápido. O sentimento de orgulho foi tão grande quanto o de ver um filho tendo sucesso na vida – relatou Clebel Cordeiro.
Um dos grandes responsáveis pelo êxito do Salgueiro foi o treinador Neco, ex-meia, campeão brasileiro de 87 pelo Sport Club do Recife. O técnico chegou ao clube em 2007, e, entre algumas idas e vindas, permanece no comando da equipe até hoje.
- Neco tem uma relação de amizade muito boa conosco. Acreditamos no trabalho dele, e, mesmo com alguns resultados ruins que aconteceram no passado, ele tem a total confiança da diretoria e da torcida do Salgueiro para exercer seu trabalho – disse José Guilherme, ex-presidente.

Neco, técnico do Salgueiro (Foto: Tiago Medeiros / GloboEsporte.com) 
Ainda no cargo, Neco levou o Salgueiro para a Série B do Brasileiro em 2010

Verde de esperança
A história de José Guilherme é um dos maiores exemplos da forte relação entre a cidade e o Salgueiro Atlético Clube. Na época da profissionalização, ele tinha o desejo de ajudar o time de alguma maneira. Como não dispunha de aporte financeiro, se ofereceu a ser condutor do ônibus da equipe. De motorista, foi nomeado diretor, chegando posteriormente à presidência.
- Salgueiro é uma cidade pequena e muito carente. Antes, a população vivia chateada pelo fato de o município ser conhecido como um dos integrantes do polígono da maconha. Hoje, o povo está mais feliz, e a prova disso é que cerca de 15% da população da cidade comparece aos jogos.
Segundo dados do IBGE, o município de Salgueiro é habitado por 56.641 pessoas. A média de público do time no Campeonato Pernambucano é de 7.375 torcedores, contando somente o público pagante.

Obras no estádio Cornélio de Barros, Salgueiro-PE (Foto: Tiago Medeiros / GloboEsporte.com) 
Obra ampliou capacidade do Cornélio de Barros
Apesar da fraca campanha na Segundona do ano passado, que resultou no rebaixamento à Série C, várias melhorias estão sendo feitas no clube para que o Carcará continue voando alto. Por ter chegado à Série B, o Salgueiro ganhou um presente do governo de Pernambuco. A reforma do seu estádio, o Cornélio de Barros, foi concluída em fevereiro, com a capacidade elevada de 5 mil para 12 mil pessoas.
A modernização não fica somente na reforma do estádio. Já está sendo construído um centro de treinamento na cidade, com três campos oficiais e estrutura adequada para a preparação do time sertanejo.
Assim, se depender do hino do clube, feito pelo forrozeiro e compositor da Limão com Mel, Zezito Doceiro, o Salgueiro, que tem no Pernambucano-2012 o melhor começo de uma equipe sertaneja até então, continuará “caçando” seus oponentes na busca para se consolidar como uma grande força do futebol nordestino.
Carcará, pega, mata e come.
Carcará, não vai morrer de fome.
Carcará, mais coragem do que homem.
Carcará, pega, mata e come!

Portuguesa x Salgueiro (Foto: Marcos Ribolli / Globoesporte.com) 
Salgueiro foi rebaixado para a Série C do Brasileiro ano passado
matéria especial do globoesporte.com
por Mário Sérgio - BLOG TERRA NOVA

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